Dano Decorrente de Defeito de Serviço
Ao adquirir um serviço o que se espera é que este seja executado da forma correta e gere o resultado esperado, todavia, nem sempre isto acontece, como em casos de defeito de serviço.
Este fato gera insatisfação ao consumidor, tendo em vista que em decorrência deste defeito de serviço o consumidor pode arcar com danos que causam prejuízo àquele que buscou um serviço de qualidade o qual não foi entregue.
Diante deste cenário, é importante conhecer exatamente como opera a legislação frente a estes casos, o que se entende por serviço e, principalmente, como o legislador tratou de amparar o consumidor vítima de um defeito de serviço.
O que você verá nesse artigo:
Dano e direito do consumidor
Antes de nos aprofundarmos no objeto central do presente artigo, é preciso entender como o dano é tratado quando falamos em direito do consumidor.
Se entende por dano aquele que está ligado com a diminuição, a perda. Assim a ideia de dano se refere as modificações do bem estar da pessoa, do ofendido, que decorre da perda ou diminuição de seus bens patrimoniais ou extrapatrimoniais
Para que haja uma relação consumerista, é preciso que estejam presentes os pressupostos elencados no artigo 2º e 3º do CDC, ou seja, que esteja presente a figura do fornecedor e do consumidor:
Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Esta legislação adotou a chamada responsabilidade civil objetiva quando se trata de relação consumerista, isto porque a responsabilidade civil do fornecedor fundada na culpa não se mostrou suficiente para abarcar a reparação dos danos ocasionados aos consumidores, em razão da dificuldade de demonstrar a conduta culposa do agente causador do dano.
Desse modo, a fim de proteger a parte vulnerável da relação de consumo, qual seja, o consumidor, o Código de Defesa do Consumidor consagrou o regime da
responsabilidade civil objetiva fundada no risco da atividade desenvolvida pelo fornecedor.
A responsabilidade civil objetiva em linhas gerais é aquela em que é necessário que seja demonstrado a) dano; b) conduta; c) nexo de causalidade.
Ou seja, não é analisada a culpa do agente, sendo como visto acima, fundada no risco da atividade exercida. Esta Teoria do Risco, a qual o autor Orlando Gomes “certas atividades do homem criam um risco especial para os outros, e a segunda, a consideração de que o exercício de determinados direitos deve implicar a obrigação de ressarcir os danos que origina.”
Diante desta teoria, os fornecedores de serviço buscam expor ao mercado um serviço de qualidade, o qual deve passar por etapas de capacitação a fim de que de fato seja oferecido um serviço apto a atender as expectativas do consumidor e consequentemente evite o chamado dano decorrente de defeito de serviço.
Desta forma, estando presentes os elementos caracterizadores da responsabilidade civil objetiva, nasce o dever de reparar. Especificamente em relação ao fornecedor de serviço, o Código de Defesa do Consumidor assim dispõe:
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
Da mesma forma, a responsabilidade civil objetiva está prevista no Código Civil em seu artigo 927:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Assim, feita esta importante introdução, vamos entender o que de fato se entende por serviço para assim chegarmos ao dano decorrente de defeito de serviço.
Serviço
A previsão legal de serviço encontra-se no artigo 3º, §2º do Código de Defesa do Consumidor:
§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
Em relação a atividade é importante entender que serviço é, tipicamente, atividade, sendo uma ação humana que tem em vista uma finalidade, nas palavras do autor Rizzatto Nunes.
Estes serviços podem ser duráveis e não duráveis, conforme o disposto no artigo 26, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor.
Os serviços não duráveis são aqueles que se exercem uma vez prestados, como por exemplo, transporte, hospedagem e diversões.
Já os serviços duráveis são aqueles que tem uma continuidade no tempo em decorrência de uma estipulação contratual, por exemplo, serviços escolares e planos de saúde. Ainda aqueles que apesar de não terem uma continuidade, possuírem como resultado um produto, como no caso de uma pintura, serviços de assistência técnica e consertos em geral.
Ademais, ressalta-se que a legislação foi bem clara em relação aos serviços sendo aqueles fornecidos mediante remuneração.
Ainda, houve a exclusão dos serviços de caráter trabalhista, tendo em vista possuírem legislação própria e não estarem presentes as figuras de fornecedor e consumidor na conotação consumerista a que se estuda.
Continuando, destacamos que os serviços são privados e também públicos:
Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código
Assim, em relação aos serviços públicos estes podem ser prestados de forma direta pela administração pública, como também por suas autarquias, fundações e sociedades de economia mista.
Sabemos que é muita informação, de forma que guardaremos este tema específico para um próximo artigo em que trataremos dos serviços públicos e os pressupostos e princípios que regem esta modalidade de serviço.
Entendido o que são serviços, vamos agora entender a diferença de defeito e vício, para que não haja confusão ao se deparar com um desses institutos.
Vício x Defeito
É comum acharem que vicio e defeito são sinônimos, todavia hoje você entenderá porque não são.
Na legislação, há diferença entre eles sendo os defeitos previstos nos artigos 12 a 14 e os vícios nos artigos 18 a 20.
Vício pode ser de qualidade ou quantidade, de forma a tonar os produtos ou como estamos estudando em especial aqui, os serviços impróprios, insuficientes, inadequados ao consumo, podendo inclusive lhe diminuir o valor.
Ainda, são considerados vícios os decorrentes da desconformidade havida em relação às indicações constantes na embalagem do produto ou em caso de serviços na oferta ou mensagem publicitária.
Estes vícios podem ser aparentes ou então ocultos, quando após algum tempo de uso aparecem.
Já em relação ao defeito, este pressupõe o vício, ou seja, é um dano maior ocorrido em decorrência do vício que já era inerente ao produto ou serviço. Assim, o dano ocasiona danos além, podendo ser de ordem material, moral, estética ou a imagem, podendo ainda ser estes todos de forma conjunta.
Por fim, o vício pertence ao próprio produto ou serviço, por outro lado, o defeito pode atingir o patrimônio jurídico do consumidor, de forma que se fala em acidente de consumo quando há a presença de um defeito, pois este que atinge de forma direta o consumidor.
Em relação a reparação do vício de serviço a legislação assim resolve:
Art. 20. O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:I – a reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível;II – a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;III – o abatimento proporcional do preço.
§ 1° A reexecução dos serviços poderá ser confiada a terceiros devidamente capacitados, por conta e risco do fornecedor.
§ 2° São impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade.
Desta forma, fica a critério do consumidor a maneira em que deseja ser reparado pelo dano causado pelo serviço inicialmente prestado.
Dano decorrente de defeito de serviço
Após o estudo isolado de como se opera a responsabilidade civil nas relações consumeristas e também o que se entende por serviço e a diferença de vício e defeito, passamos ao tema principal deste artigo, qual seja, o dano decorrente de defeito de serviço.
O defeito de serviço pode se dar por conta da oferta e publicidade, uma vez que estas sendo o meio de apresentação de serviço estarem aptas a figurarem como geradoras do dano. Isto porque pode haver um desencontro entre o que foi efetivamente prestado e o que foi ofertado, gerando prejuízos, eventuais gastos e desgastes desnecessários por parte do consumidor que ao final se viu iludido.
Também uma informação pode ser geradora do dano decorrente de defeito de serviço, assim, por conta de uma informação inadequada, insuficiente ou em razão da falta dela, este fato pode gerar um dano ao consumidor, afinal, alguns serviços sequer funcionam sem que as informações sejam claras e precisas.
Nestes casos, temos que a responsabilidade pelo dano causado é do fornecedor do serviço, que pode se dar de forma isolada, como ocorre com serviços diretos, por exemplo, consultas médicas, serviços no salão de beleza, mas também pode ocorrer diante de uma cadeia de fornecedores, um conjunto, como a administração do cartão de crédito que engloba o serviço do banco, da administradora, dos correios que enviam os boletos e os canais de comunicação. Nestes casos há a chamada responsabilidade solidária dos fornecedores na medida de suas participações.
Desta forma, demonstrado os danos causados por conta de um defeito de serviço, é devida a reparação destes danos, que como vimos é de responsabilidade do agente causador, o fornecedor.
Neste ponto, da mesma forma que existem excludentes de responsabilidade para danos causados por defeito de produto, há também para defeito de serviço. Vejamos o que diz o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor:
§ 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas.
§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
I – que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Portanto, é de extrema importância demonstrar o nexo de causalidade entre o serviço prestado e o dano causado, bem como o causador do dano, para assim estarmos diante de um caso de dano decorrente de defeito de serviço em que incide a responsabilidade civil objetiva, cabendo reparação do dano.
Considerações finais
Da mesma forma que produtos podem vir com defeito e causar danos ao consumidor é possível a existência de defeito de serviço que de igual forma causa danos ao consumidor.
Como vimos o dano decorrente de defeito de serviço diz respeito àquele em que atinge o patrimônio jurídico do consumidor, sendo ele de forma material, moral, estética e/ou de imagem, sendo o vício inerente ao serviço e o defeito algo além deste vício, todavia, como visto, o defeito pressupõe um vício.
Em relação a responsabilidade pela reparação, vimos inicialmente que a responsabilidade é a chamada objetiva, de forma que não é necessário demonstrar a culpa do causador do dano. Assim, fica responsável o fornecedor do serviço, que pode ser um só ou também todos os fornecedores que operam na execução de determinado serviço, como muito comum quando se fala em cartão de crédito.
Desta forma, existindo dano decorrente de defeito de serviço, causador do dano e o nexo de causalidade entre o fato gerador e este dano, é evidente a necessidade de reparação do dano causado ao consumidor.
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