Acidente do Trabalho

Acidente do Trabalho após Reforma Trabalhista

Em 2017 tivemos uma das maiores reformas trabalhistas dos últimos tempos. Quando ainda estávamos nos acostumando com essas alterações, veio a pandemia de COVID-19 e transformou de vez as relações de trabalho no mundo. Bom, o acidente do trabalho faz parte dessa realidade e por isso hoje trouxemos o assunto.

Um local de trabalho adequado precisa oferecer condições de segurança para viabilizar a rotina e o exercício do trabalho.

Mas nem sempre a capacidade para o trabalho está acompanhada de todas as medidas de proteção ao empregado, dando lugar para doenças profissionais, doenças do trabalho e acidentes no ambiente funcional.

Vamos começar com o básico: o que é acidente de trabalho segundo a CLT?

O que é acidente do trabalho?

Acidente do trabalho

Existem muitos tipos de acidente do trabalho. Existe o mais comum, que é o acidente típico, em que o funcionário se machuca na fábrica, na loja ou na empresa, e acidentes atípicos, que são considerados acidente com a intenção de gerar direitos iguais.

Esta última hipótese é vista como acidente do trabalho por equiparação, é o que ocorre por exemplo com quem machuca o joelho em casa, mas com o excesso de peso que precisa transportar no trabalho tem de imobilizar a perna e se afastar. 

Ao contrário do que muita gente pensa, a definição para acidente de trabalho não está na CLT, mas na lei previdenciária 8.213/91. 

Agora o mais importante: quando configura acidente do trabalho?

É importante estar ciente de que é necessário perda ou redução da capacidade de trabalho, com afastamento temporário ou permanente das funções.

Será acidente do trabalho quando nessas condições o afastamento durar mais do que 15 dias. Após esse período, se o trabalhador ainda estiver afastado, terá direito ao auxílio previdenciário. 

Com o fim do benefício, o trabalhador retorna à atividade.

Quem sofre acidente do trabalho?

Quem sofre acidente do trabalho?

Não são todos os trabalhadores previdenciários que têm direito ao benefício acidentário. 

Apenas segurados obrigatórios podem receber auxílio-doença acidentário pelo INSS:

  • Empregados CLT;
  • Domésticos;
  • Autônomo e MEI;
  • Ruralista em economia familiar (segurado especial)

Em caso de dano físico permanente, os contribuintes individuais não têm direito ao benefício permanente de auxílio-acidente.

Tipos de acidente: Acidente de trajeto

Tipos de acidente: Acidente de trajeto

O acidente de trajeto é o mais polêmico desde a reforma trabalhista. Muitos chegaram a defender até a extinção desse tipo de acidente em decorrência da legislação de 2017. 

Mas o empregado não precisa se preocupar: qualquer problema provocando lesão corporal ou perturbação funcional a caminho do trabalho é considerado acidente do trabalho, e pode gerar responsabilidade do empregador.

Além dos clássicos da batida de carro, inclusive com veículo de propriedade do segurado, ou do ônibus que quebra, existe um outro caso bastante curioso. 

Há alguns dias, eu ouvi o relato de um trabalhador do censo demográfico do IBGE que foi assaltado no ponto de ônibus retornando para casa.

Como primeiro reflexo, ele entregou o celular pessoal e escondeu o tablet utilizado para as pesquisas de recenseamento. O homem foi embora apenas com o celular e sem machucá-lo.

Então te pergunto: existiu acidente do trabalho, ou mais especificamente, acidente de trajeto? 

A resposta é não! Infelizmente, segundo a lei nº 8.213/91 o acidente de trabalho protege a integridade física e não patrimonial do trabalhador.

Por isso, exceto em situação de lesão ou de morte durante o assalto, não haveria propriamente acidente de trabalho. Outra coisa é a perda de itens pessoais nas dependências do local de trabalho, nesse contexto, ainda que sem violência, caberia indenização ressarcitória.

Sempre que for vítima de crime a caminho do trabalho, certifique-se de realizar um boletim de ocorrência. Em caso de acidentes de trânsito, tire fotos com data e guarde qualquer protocolo de acionamento de seguradoras, fiscais de trânsito e/ou oficinas mecânicas.

Afinal, cada caso é um caso e os registros podem ser importantes no futuro.

Briga entre funcionários ou com clientes

Briga entre funcionários ou com clientes

Na lista de acidentes de trabalho, que pode ser encontrada pelo artigo 21 da lei 8.213/91, temos o caso da ofensa física intencional, inclusive por parte de terceiro por motivo de disputa relacionada ao trabalho. 

Ou seja, com clientes durante atendimentos, entre funcionários que colaboram juntos, conflito supervisor e subordinado, etc.

No entanto, não podemos esquecer de que o acidente do trabalho pede afastamento, ainda que temporário das funções, por tempo mínimo de 15 dias para ter todas as repercussões da lei, com principal destaque para a estabilidade provisória.

Imagine, por exemplo, que Suzane venda sapatos em uma loja no centro da cidade. Sem perceber, a vendedora embalou para entrega um sapato diferente do escolhido pela cliente. 

Passada a política de troca de 30 dias, a cliente retorna ao estabelecimento 3 meses depois e, descontente, ameaça a vendedora em público e joga todos os sapatos expostos no chão.

O caso não geraria, por si só, um acidente do trabalho, mas poderia gerar se, por exemplo, Suzane fosse empurrada de uma escada e tivesse uma fratura do disco lombar.

Danos longos à saúde mental também podem ser considerados acidente do trabalho, inclusive com encaminhamento à Previdência social se comprovada incapacidade temporária para a atividade.

Horário fora do expediente

Ainda que fora do horário de expediente, acidente do trabalho é o que ocorre pelo dano ao trabalhador, com resultado de afastá-lo temporária ou definitivamente do trabalho e de suas funções. 

Além do acidente de trajeto, sofre acidente fora do expediente quem:

  • está na execução de ordem ou realiza serviço mandado pela empresa;
  • presta serviço nessa condição para evitar prejuízo ou gerar lucro para a empresa; 
  • viaja a pedido da empresa, inclusive para estudos de capacitação.

Ainda que em um contexto a parte das dependências do local, ou do horário de expediente, é possível configurar acidente determinado pela natureza do trabalho.

Doença ocupacional

A doença ocupacional talvez seja a principal causa de paralisação permanente ou temporária do exercício do trabalho dos segurados.

Ao contrário dos acidentes típicos no exercício do trabalho a serviço, a doença ocupacional costuma ser silenciosa e pode se manifestar anos e anos após o primeiro sinal de que algo não vai bem. 

Um bom exemplo é o desgaste da coluna.

É muito recorrente para trabalhadores braçais que tenham as vértebras deterioradas pelo excesso de peso. Com o tempo, os equipamentos de proteção não conseguem mais sustentar as dores diante da carga de trabalho. 

Sempre que essas dores tenham relação com o trabalho, gerando atenção médica e multidisciplinar, de fisioterapeutas e farmacêuticos, por exemplo, é um grande indício de que o afastamento é resultante de exposição ao trabalho, podendo ser caracterizado como acidente pelo artigo 21-A da lei 8.213/91.

Por essas e por outras, a empresa deve esta atenta à segurança e saúde no trabalho para evitar riscos de acidentes e prejuízos, tanto na atividade econômica como na vida do trabalhador.

Voltei do INSS e a empresa não me aceita: limbo trabalhista

A morte ou a perda da capacidade de trabalho por mais de 15 dias permite que o trabalhador seja encaminhado ao Instituto nacional do seguro social, ou INSS, para receber benefício acidentário, ou pensão por morte pelos dependentes, conforme o caso. 

Acontece que todo CLT tem alguma história para contar sobre o momento em que precisou passar pela perícia INSS afastado do trabalho, e geralmente não é tão positiva.

Após a primeira batalha, que é justamente começar a receber o pagamento, a próxima será o fim do benefício. 

No acidentário, recuperada a incapacidade temporária de trabalhar, os segurados são liberados pela perícia médica para retornar ao mercado de trabalho. 

O problema é que muitas empresas pedem aval do médico do trabalho antes de aceitar o trabalhador acidentado de volta. Sendo liberado pelo INSS, e negado pela empresa, o trabalhador cai em um limbo trabalhista e previdenciário.

Isso porque estão impedidos de recuperar o salário pelo trabalho, ao tempo que também estão sem benefício previdenciário. 

Na aposentadoria por invalidez é ainda mais grave. Muitos empregadores dão o contrato de trabalho por perdido e cortam completamente a comunicação com o trabalhador aposentado por invalidez. 

No entanto, existem várias possibilidades de cessação da aposentadoria invalidez, reativando o contrato de trabalho e retornando a responsabilidade de renda para o empregador.

Nesses casos, em que houver omissão, a Justiça do trabalho precisa ser acionada.

Estabilidade no emprego

Quando o trabalhador CLT sofre um acidente por falha de segurança no trabalho, quais os direitos dele?

Um deles é a estabilidade no emprego. O trabalho dos segurados referidos no art. 11 da lei nº 8.213/91, estará estável por 1 ano desde o momento em que ele retorna após o benefício previdenciário de auxílio-doença acidentário. 

Por isso, é de extrema importância que a perícia do INSS reconheça que a lesão ocorre pelo exercício da atividade para indicar essa anotação no benefício. 

Além de melhorar o cálculo em uma futura aposentadoria invalidez, se for o caso, entender o afastamento como acidentário contribui com a fixação das indenizações na Justiça do Trabalho. 

A redação do parágrafo 1º do art. 4º da CLT, que fala sobre isso, foi acrescentado com a reforma trabalhista de 2017:

Art. 4º, CLT – Considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada.

§ 1º  Computar-se-ão, na contagem de tempo de serviço, para efeito de indenização e estabilidade, os períodos em que o empregado estiver afastado do trabalho prestando serviço militar e por motivo de acidente do trabalho.

A comunicação de acidente do trabalho CAT é obrigatória?

Depende de quem pergunta.  

Para o funcionário não é obrigatório informar, mas é possível.

Para o patrão, é um dever. 

Tudo porque, como já vimos, essa diferença será fundamental para uma série de direitos trabalhistas e de INSS, então é mais uma responsabilidade em troca do trabalho, a serviço de empresa.

Estudando direito do trabalho e da previdência social, passamos a compreender porque equipamentos de proteção individual e o informe imediato à autoridade competente de acidentes garantem depois vários direitos do trabalhador, além de também proteger as empresas contra o aumento no risco de acidentes.

Mas embora a lei e as boas práticas exijam comunicação da empresa em decorrência de um acidente do trabalho, nem sempre o registro é de fato realizado.

Pensando nisso, o Ministério do Trabalho disponibiliza um canal de comunicação de acidente do trabalho, que pode ser acessado aqui

O serviço está disponível para o próprio acidentado e seus dependentes, sindicatos, médicos e autoridades. Em caso de acidente, a empresa deve comunicar até o primeiro dia útil seguinte, sob pena de multa prevista pelo decreto 3.048/99.

No caso de morte, a comunicação precisa ser imediata.

Pensão vitalícia e indenização

São várias as possibilidades de indenização na Justiça do trabalho, e elas estão divididas pela maneira na qual o prejuízo se apresenta, tanto no acidente do trabalho típico quanto nos demais:

  • Dano material pelos gastos;
  • Dano moral pelo abalo psicológico;
  • Dano estético pela alteração da imagem;
  • Pensão vitalícia

A forma de indenizar dano moral foi verdadeiramente revolucionada pela reforma trabalhista de 2017. Quando um trabalhador sofre um acidente com dano moral, o juiz utiliza os critérios dos artigos 223-A e 223-G da CLT para fixar valores de cobrança.

A reforma estabeleceu como margem a gravidade do dano, que pode ir de leve a gravíssima. Esse assunto foi levado ao Supremo Tribunal Federal em 2023 por várias entidades públicas.

O que ficou decidido pelas ações de inconstitucionalidade ADI 6050 e ADI 6069 é que a CLT deve ser interpretada como parâmetro e baliza na quantificação dos danos, e não como regra fixa que paralisa a aplicação do direito. 

Isso porque existem outros artigos da CLT, e inclusive do Código Civil, que podem ser utilizados na compreensão de um caso em particular. O direito trabalhista precisa ser visto como um sistema complexo pelo entendimento dos magistrados.

Mas indo adiante, o que mais gera dúvidas é a pensão vitalícia, outro direito relacionado. 

É possível que o trabalhador que sofre um acidente do trabalho receba pensão para sempre? 

A resposta é SIM.

Se o ambiente de trabalho não proporciona trabalho seguro, gerando redução ou perda da continuidade da profissão, há direitos garantidos para a subsistência do trabalhador.

Se a lesão à saúde for permanente, cabe pensão vitalícia. Isso tende a ocorrer em casos graves de amputação ou perda definitiva de habilidade.

O entendimento dos Tribunais brasileiros tem sido no sentido de não estender esse direito aos herdeiros com a morte do trabalhador (TRT3, 2021).

Rescisão indireta

Passada a questão das indenizações, cabe a pergunta sobre o contrato na relação trabalhista de empresa ou de empregador doméstico. Como fica?

É de determinação legal quais as condições especiais em que o trabalho deve ser desempenhado. Como o acidente do trabalho ocorre com o descumprimento de regras, estamos diante de falta grave cometida pelo patrão.

A falta grave durante o contrato de trabalho permite ao funcionário que peça a rescisão de suas obrigações em decorrência de motivo legal. 

Muitas vezes há violação no atendimento de recomendação elaborada pelo Ministério do trabalho.

Isso está no art. 483 da CLT e funciona como término do contrato. Pedindo o fim da relação, o funcionário pede também o acerto trabalhista, liberação de seguro-desemprego e indenizações pelo acidente do trabalho. 

Esse caminho é o recomendado quando o empregado se vê diante do limbo trabalhista.

Acidente do trabalho aposenta por invalidez?

Pode ser que sim.

O acidente típico é muitas vezes causador de perda física ou de transtorno definitivo. Lembrando que doenças podem ser causadas também pela rotina ocupacional sempre que contrária à segurança do trabalho.

Existem hoje médicos e profissionais da área de saúde especializados em bem-estar laboral que podem aferir se o trabalho é realizado em condições hostis, ou adequadas, ao corpo e ao envelhecimento saudável.

No site do Ministério público do trabalho é possível acessar uma série de regulações voltadas à saúde e à segurança do trabalhador, inclusive quais são os tipos de práticas que melhoram o quesito.

A aposentadoria por invalidez é um benefício de incapacidade previdenciário para trabalhadores que não podem continuar a trabalhar por tempo indeterminado.

O acidente do trabalho é causa para aposentadoria invalidez quando o trabalhador é considerado incapaz para o trabalho e insuscetível de reabilitação que garanta subsistência, pelo decreto 3.048/99. 

O benefício não depende de auxílio-doença acidentário anterior, apenas perícia médica que identifique a relação entre trabalho e lesão.

Por fim, o cálculo da aposentadoria por invalidez é mais benéfico quando o motivo do benefício é acidentário, uma novidade trazida pela reforma da Previdência com a EC 103 de 2019.

Carência para benefícios INSS no acidente do trabalho

O decreto 3.048/99 está cheio de atualizações recentes. Uma das novidades separa dois grupos:

  • quem busca concessão de benefício dentro da qualidade de segurado;
  • quem busca concessão de benefício fora da qualidade de segurado.

Para quem está fora da qualidade de segurado, ou seja, sem carteira registrada, seguro-desemprego ou pagamento de guia previdenciária há mais de ano, será necessário retomar as contribuições por seis meses até nova concessão de benefício aposentadoria invalidez.

A previsão está no art. 27-A do dec 3.048/99, mas atenção!

Existe exceção no benefício acidentário, especialmente quando ocorre pelo exercício do trabalho!

Desde o momento de reingresso do trabalhador ao INSS que estava fora da qualidade de segurado, é possível a concessão do benefício de aposentadoria invalidez acidentário pelo art. 29 do dec 3.048/99, sem carência.

Conclusões

Além de possibilitar a definição de acidente do trabalho e estabilidade no emprego, a lei nº 8.213 também explica quem faz parte da Previdência Social no Brasil. Pelo art 11 desta lei, temos acesso a todos os segurados obrigatórios e facultativos, ou seja, aqueles com acesso previdenciário.

E atenção a esse detalhe: os segurados referidos no inciso VII, isto é, o trabalhador rural em regime familiar, apesar de não trabalhar de carteira assinada também sofre acidente do trabalho!

O inciso VII do art explica linha por linha critérios que configuram ou não essa categoria de trabalhador.

Como vimos, acidente do trabalho é lesão ou perturbação física que afasta o trabalhador das suas funções, de modo temporário ou permanente.

Se está dentro de seus planos buscar indenização por falha constante da relação de trabalho, saiba que o empregado, e seus dependentes em caso de óbito, estão protegidos pelos direitos garantidos em acidentes do trabalho. 

Welington Augusto

Advogado especializado em Direito do Trabalho focado nos direitos dos trabalhadores. Autor de artigos jurídicos e palestras, além de divulgar conteúdo em vídeo na internet sobre os direitos dos trabalhadores.

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