Direitos Trabalhistas

Direito à desconexão: o que todos deveriam saber

Muitos nem conhecem esse direito, e esse fato prejudica muito a qualidade de vida do trabalhador. Trata-se do direito à desconexão, que é um direito relativamente novo, uma vez que surgiu com o avanço da tecnologia ao possibilitar novas ferramentas de comunicação, efetivando o contato em tempo real independente da hora do dia.

É claro que o avanço da tecnologia tem inúmeros pontos positivos, mas ao alinhar essa tecnologia no meio profissional, é preciso ter cautela para não extrapolar limites. Este estudo se acentuou após a pandemia, em que muitos são os empregadores que optaram pela manutenção do teletrabalho ou mesmo a modalidade híbrida.

O que é o Direito à Desconexão?

Nos dias de hoje é muito simples se comunicar com amigos, familiares e até mesmo colegas de trabalho. Por conta disso e diante desta facilidade muitas empresas aderiram às ferramentas de comunicação.

Assim, e-mails, mensagens de texto, chamadas de vídeo, se tornam cada dia mais comuns no cotidiano do trabalho, sendo tal fato positivo, mas também prejudicial em alguns pontos.

O fato de não haver um limite imposto até mesmo pelo funcionário, faz com que haja uma confusão entre vida pessoal e profissional. A realidade é de que a pessoa nunca desliga do trabalho e passa a viver para o trabalho.

Assim, surge o debate do direito à desconexão que seria o direito de aproveitar a vida além das atividades laborativas, durante o período de descanso.

Infelizmente a CLT nem mesmo com a Reforma foi capaz de mencionar o direito à desconexão, sendo essa problemática jogada nas mãos do Judiciário e da doutrina. Afinal, apresenta-se como um problema contemporâneo diante da possibilidade de se comunicar de inúmeros meios com o funcionário dando certa liberdade de horário.

Fazendo um paralelo de modo a encontrar implicitamente o direito à desconexão no texto Constitucional e infraconstitucional, verifica-se que tal ato é totalmente errôneo ferindo inclusive a jornada de trabalho e o direito ao descaso entre jornadas. Torna-se assim um ambiente de trabalho pesado, sendo ambiente de trabalho não apenas a estrutura física, mas também as suas condições até mesmo imateriais.

Na realidade a CLT apenas prevê, no artigo 6º, o controle de jornada nos seguintes dizeres “os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio“.

Logo, há previsão da possibilidade de controle de jornada, bem como a igualdade do trabalho realizado no local físico de trabalho e aquele realizado remotamente, todavia, não se atentou o legislador em prever um direito de proteção ao trabalhador, que é o direito à desconexão.

Nesse contexto, o Judiciário vem tomando a frente deste debate, de forma a considerar que cobranças via meios de comunicação fora do horário de trabalho, não podem prejudicar o período de folga, uma vez que o próprio TST esclarece que “essa conexão mental sem descanso pode gerar transtornos mentais e prejudicar relações sociais do indivíduo”.

Com isso, tem-se o direito à desconexão como aquele que garante que o funcionário não fique sobrecarregado e possa ocupar seu momento de descanso com outras atividades.

Questão que se instaura é a realidade de muitos, o teletrabalho e suas implicações no que se refere ao direito à desconexão.

Teletrabalho

teletrabalho

Em linhas gerais, o teletrabalho é aquele, nos termos dos artigos 75-A a 75-E da CLT em que “a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo”.

Originalmente, o teletrabalho foi incluído na exceção do regime de jornada de trabalho do artigo 62 da CLT, ou seja, em razão da dificuldade de controle, não haveria direito ao pagamento de horas extras, adicional noturno. Contudo, de acordo com alguns precedentes do TST, se houver meio de controle patronal da jornada, é possível reconhecer os adicionais.

Justificativa disso é o próprio artigo 6º da CLT, que equipara o teletrabalho com o trabalho presencial. Desse modo, evidente que inexistindo distinção, as garantias trabalhistas são preservadas.

Conforme menciona a autora Rosane Gauriau na Revista do TRT3, o direito à desconexão incide no teletrabalho uma vez que deve-se atentar ao período de expediente do trabalhador, em respeito ao direito à saúde, ao repouso, ao lazer, à vida em família e em sociedade.

Para autora, o fato que ficou evidente durante a pandemia foi que o teletrabalho reduz significativamente a fronteira entre vida pessoal e profissional, ocasionando uma hiperconexão.

Logo, mostra-se necessária a regulamentação do direito à desconexão alinhada aos direitos fundamentais, de modo a criar um ambiente de trabalho saudável, com o devido respeito à privacidade, intimidade e direito de descanso.

O que fazer?

Atualmente está em tramitação o Projeto de Lei nº 4.044, de 2020, que visa disciplinar o teletrabalho quanto às regras da jornada de trabalho, períodos de descanso e férias, dispondo sobre o direito à desconexão do trabalho e até mesmo o conceituando.

Todavia, enquanto aguarda-se a análise deste Projeto bem como sua eventual publicação, é preciso se atentar à frequência que a cobrança ocorre, as tentativas de resolver a questão internamente e sem êxito recorrer ao Judiciário.

Como fundamento atualmente se usa:

  • Dignidade da pessoa humana;
  • Convivência familiar;
  • Limitação da Jornada de Trabalho;
  • Direito à intimidade e à vida privada;
  • Repouso semanal;
  • Direito à saúde;
  • Férias anuais remuneradas.

O que recorrentemente tem se solicitado no judiciário é o direito a horas extras em razão do empregador continuar demandando o empregado após o seu expediente.

Ademais, no que diz respeito ao teletrabalho, é essencial – tanto para qualidade no ambiente de trabalho como para o real controle do empregador – que seja fixado um controle de jornada, evitando a violação ao direito à desconexão.

Resumindo…

resumindo direito à desconexão

O direito à desconexão não possui previsão legal, porém, como visto, ele surge do cenário atual que criou novos ambientes de trabalho a partir do avanço da tecnologia. Assim, é possível pelos meios de comunicação prosseguir com o trabalho remotamente.

Ocorre que a hiperconexão apresenta-se como prejudicial para a saúde e até mesmo qualidade do trabalho desempenhado pelo funcionário. Manter o funcionário à disposição recorrentemente fora do horário de trabalho caracteriza violação ao direito à desconexão.

Veja, a habitualidade é que demanda atenção, afinal o trabalhador não pode estar à disposição 24 horas por dia, é preciso que este desfrute do seu intervalo entre as jornadas e tenha seu merecido descanso. Agora, quando se fala em maneira excepcional, é preciso ponderar as circunstâncias que demandaram o contato fora de hora.

Ou seja, tudo é uma questão de análise do caso concreto, entretanto, não se pode por conta das facilidades que a tecnologia proporciona prejudicar a qualidade de vida do trabalhador, o qual tem uma vida além da sua rotina profissional.

Fato é, que o direito à desconexão está interligado e muitos defendem que decorre de direitos fundamentais como saúde, descanso, convivência familiar e a dignidade da pessoa humana. Assim, necessária a sua regulamentação em prol do futuro, o qual diante do contexto atual, apresenta-se como cada dia mais virtual.

Gilberto Vassole

Advogado atuante na área do Direito Previdenciário, Trabalhista e Direito Empresarial. Membro efetivo da comissão de direito do trabalho da OAB/SP, Pós Graduado e Mestre em Processo Civil.

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