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Assinatura Eletrônica tem validade jurídica no Brasil?

Em tempos de pandemia, muitos processos de mudança que já estavam em andamento na nossa vida ganharam mais fôlego e se aceleraram, como forma de facilitar o distanciamento social. Um exemplo disso é a transição dos documentos em papel para documentos digitais e, junto com ela, a adoção da assinatura eletrônica.

Se você já recebeu uma solicitação para fazer a assinatura eletrônica de algum documento, é bem possível que uma pergunta tenha cruzado sua mente: essa assinatura tem valor? Ou, em termos mais técnicos, ela tem validade jurídica?

Essa é uma questão normal, já que, para quem não está bem familiarizado com essa nova tecnologia, ela parece mais fácil de fraudar do que a assinatura tradicional. E, já que a novidade chegou para ficar, é importante entender como ela funciona, inclusive do ponto de vista legal.

Por isso, neste artigo, você vai entender melhor a assinatura eletrônica e descobrir se ela tem validade jurídica no Brasil. Ao longo do texto, vamos falar bastante sobre contratos e usar alguns exemplos da relação de consumo para explicar o assunto; no entanto, tenha em mente que essas informações se aplicam a qualquer tipo de documento e relação jurídica.

Entenda a Assinatura Eletrônica

A assinatura eletrônica é uma tecnologia desenvolvida para a autenticação de documentos digitais. Graças a essa tecnologia, muitas empresas estão progressivamente se tornando “paperless”, ou seja, não utilizam mais papel no dia a dia. É uma questão de praticidade, economia e sustentabilidade.

Assim, por exemplo, se for necessário assinar um contrato, não será preciso trocar uma cópia física, impressa, entre as partes. O arquivo virtual é suficiente, permitindo que cada pessoa assine usando seu smartphone ou computador, a qualquer hora e em qualquer lugar.

Existem, na verdade, vários métodos pelos quais essa autenticação pode ser realizada. Por exemplo, alguns serviços utilizam o certificado digital, enquanto outros solicitam que o usuário informe seu CPF ou faça a verificação com um código enviado por e-mail.

Existem até mesmo casos em que a assinatura eletrônica é realizada por meio de um simples clique em um botão. Por exemplo, quando você clica no botão de “Aceitar” ao contratar um serviço pela internet, você está, tecnicamente, assinando eletronicamente um contrato com o provedor desse serviço.

Assinatura Eletrônica ou Assinatura Digital?

assinatura eletrônica

Você pode ter ouvido algumas vezes o termo “assinatura digital” e interpretado como sinônimo de assinatura eletrônica, mas cuidado: na prática, eles não são exatamente a mesma coisa. A assinatura digital é apenas um dos tipos de assinatura eletrônica.

Falamos em assinatura digital apenas naqueles casos em que o grau de segurança é máximo, aplicando uma “camada extra” de proteção na autenticação do documento. A assinatura digital exige o uso de um certificado digital, uma espécie de documento virtual de identificação do usuário, assegurando, assim, que ninguém pode assinar em seu nome.

A validade jurídica da Assinatura Eletrônica

Agora que você já entendeu um pouco melhor o conceito de assinatura eletrônica, vamos ao que realmente nos importa: como essa nova tecnologia é vista, do ponto de vista legal. Um documento assinado eletronicamente tem a mesma validade jurídica de um documento assinado com caneta e papel?

Para chegar à resposta, antes de mais nada, nós temos que olhar para a lei brasileira. A principal lei que trata de contratos é o Código Civil, ou CC. No artigo 107, vemos que:

Art. 107. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir.

Em outras palavras, as únicas situações em que o contrato precisa de uma forma específica para ter validade são aquelas em que a lei expressamente exigir essa forma. Em todos os outros casos, o contrato é válido independentemente de ser físico ou digital, ou mesmo verbal.

Essa ausência de um rigor maior na forma está relacionada com um princípio central do Direito Civil, que é a autonomia da vontade. Esse princípio, basicamente, estabelece que as pessoas têm liberdade para celebrar contratos com quem quiserem e da forma que preferirem.

Se a forma do documento é livre, entende-se que a forma da assinatura também é. Para que seja considerada válida, basta que sua autenticidade seja garantida – ou seja, que não exista dúvida quanto ao fato de que a assinatura não foi forjada ou adulterada.

Outro código que traz uma previsão sobre a assinatura eletrônica é o Código de Processo Civil, ou CPC. Esta é a redação do artigo 441:

Art. 441. Serão admitidos documentos eletrônicos produzidos e conservados com a observância da legislação específica.

É importante notar que esse artigo está se referindo especificamente aos documentos que são admitidos como prova dentro de um processo. Porém, justamente pelo fato de que as normas processuais aceitam documentos digitais (e assinados eletronicamente) como prova, podemos concluir que a legislação brasileira reconhece a validade jurídica da assinatura eletrônica.

Além das normas gerais do CC e do CPC, existem outras mais específicas tratando da validade das assinaturas eletrônicas. É o caso da Medida Provisória n. 2.200-2, de agosto de 2001. Veja o que diz o artigo 10 dessa MP:

Art. 10. Consideram-se documentos públicos ou particulares, para todos os fins legais, os documentos eletrônicos de que trata esta Medida Provisória.

§1°. As declarações constantes dos documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil presumem-se verdadeiros em relação aos signatários, na forma do art. 131 da Lei no 3.071, de 1º de janeiro de 1916 – Código Civil.

§2°. O disposto nesta Medida Provisória não obsta a utilização de outro meio de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento.

O §1º deste artigo especificamente reconhece as assinaturas digitais, isto é, aquelas realizadas com autenticação por meio de certificado digital. Enquanto isso, o §2º amplia o reconhecimento para outras formas de assinatura eletrônica; o único requisito é que o meio de assinatura escolhido seja admitido pelas partes envolvidas.

Imagine, por exemplo, que você vai fechar um contrato de prestação de serviços com uma empresa. A assinatura eletrônica pode ser utilizada e terá a mesma validade jurídica de qualquer assinatura tradicional, desde que tanto você quanto a empresa estejam de acordo com esse formato.

Mais recentemente, a Lei da Liberdade Econômica, ou Lei 13.874 de 2019, também tratou do assunto. Ela modificou a Lei 12.682 de 2012, incluindo o artigo 2-A. Veja o que diz esse artigo:

Art. 2º-A. Fica autorizado o armazenamento, em meio eletrônico, óptico ou equivalente, de documentos públicos ou privados, compostos por dados ou por imagens, observado o disposto nesta Lei, nas legislações específicas e no regulamento.

[…]

§ 4º Os documentos digitalizados conforme o disposto neste artigo terão o mesmo efeito jurídico conferido aos documentos microfilmados, nos termos da Lei nº 5.433, de 8 de maio de 1968 , e de regulamentação posterior.

[…]

§ 8º Para a garantia de preservação da integridade, da autenticidade e da confidencialidade de documentos públicos será usada certificação digital no padrão da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil).

Perceba, então, que este dispositivo confere efeito jurídico aos documentos digitalizados e reconhece os certificados digitais – aqueles utilizados nas assinaturas digitais – como forma de garantir a autenticidade desses documentos, especificamente no caso em que sejam documentos públicos.

Casos concretos sobre a validade jurídica da Assinatura Eletrônica

Casos concretos sobre a validade jurídica da Assinatura Eletrônica

Além de saber o que diz a lei, também é sempre importante entender como os Tribunais estão decidindo sobre os assuntos mais novos e polêmicos. Por isso, vamos apresentar alguns casos concretos que foram levados à Justiça e como eles foram resolvidos.

Um caso interessante foi levado ao Tribunal de Justiça de São Paulo, em uma apelação de uma ação pedindo a declaração de inexistência de relação jurídica (AC 1013982-93.2016.8.26.0005 SP).

Em resumo, o consumidor, que estava sendo cobrado pelo pagamento dos serviços contratados, entrou com a ação para pedir que o Juiz declarasse que não existia contrato com a empresa.

Nesse caso, o Tribunal considerou que o contrato celebrado por meio eletrônico era válido, pois havia documentos suficientes comprovando a contratação e a utilização dos serviços. Além disso, ao informar seus dados bancários, o consumidor estaria autorizando a cobrança das parcelas. Por isso, a assinatura eletrônica do contrato foi considerada válida.

Outro caso foi levado ao Tribunal de Justiça do Maranhão, em uma apelação de uma ação de cobrança (AC 0033554-79.2014.8.10.0001 MA).

O caso era de um consumidor que contratou serviços educacionais de uma instituição de ensino, cujo contrato foi assinado eletronicamente. Quando o consumidor não pagou as mensalidades, a instituição entrou com a ação para receber os valores devidos.

Nesse caso, o Tribunal considerou que havia provas de que o consumidor usufruiu dos serviços, pois frequentou as aulas, e de que não havia realizado os pagamentos correspondentes. Por isso, não apenas o contrato e a assinatura eletrônica foram considerados válidos, como também a demanda da instituição pelo recebimento das mensalidades em atraso.

Um fato importante que esses dois casos mostram é que a discussão a respeito da validade da assinatura eletrônica já não gira mais em torno da questão técnica. Essa solução é reconhecida e aceita, mesmo nos Tribunais.

Em vez disso, a discussão, agora, gira em torno da questão prática. Se o indivíduo toma parte ativamente e usufrui da relação jurídica que o documento estabelece, ele não pode questionar a validade da assinatura simplesmente por ser eletrônica.

Suponha que você assinou eletronicamente um documento elaborado pela sua empresa, no qual ela estabelece algumas políticas internas que devem ser seguidas pelos funcionários. Então, após algum tempo, você viola uma dessas políticas e tenta questionar a validade do documento com base na forma como ele foi firmado.

Será difícil conseguir a anulação desse documento. Afinal, você no próprio ato de realizar a assinatura eletrônica, bem como no seu comportamento durante o tempo entre a assinatura e a violação, são encontrados indícios de que você aceitou os termos propostos pela empresa.

Isso não significa que não será possível questionar cláusulas abusivas presentes nas políticas internas, por exemplo. No entanto, a validade da assinatura eletrônica e, portanto, do documento em si, permanece.

Quer saber mais sobre os aspectos legais dos contratos que podem causar dúvidas no seu dia a dia? Acompanhe o da VGR Advogados!

Rafael Albertoni

Advogado, Mestre em Direito Político e Econômico, Pós-Graduado em Direito Tributário pela FGV, Graduando em Ciências Econômicas pela FECAP. Membro da Comissão de Direito Tributário da OAB.

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